QUEREMOS MULHERES VIVAS: Violência de Gênero, Responsabilidade Masculina e o Desafio Político da Proteção da Vida
Por: Francisco José de Oliveira Cientista Social A defesa da vida das mulheres constitui hoje uma agenda estruturante para a democracia brasileira. O feminicídio, categoria jurídica reconhecida desde 2015, é apenas a face mais extrema de um processo contínuo de violência de gênero construído no cotidiano. Como demonstram os estudos feministas, a violência não emerge de forma súbita: ela é resultado de padrões sociais que naturalizam hierarquias, silenciam vítimas e legitimam práticas masculinas de dominação (SAFFIOTI, 2004; SEGATO, 2012). Sob essa perspectiva, é fundamental compreender que a violência não começa no ato letal, mas se constitui em camadas: nas “piadas” que inferiorizam mulheres, no silêncio diante de abusos, nas relações masculinas que passam do limite ético, e em todas as situações em que a sociedade “finge não ver” (BOURDIEU, 2002). Esses microprocessos compõem aquilo que a literatura chama de pedagogia da crueldade (SEGATO, 2018) — um ambiente que forma, autoriza e reproduz comportamentos violentos. HOMENS: AGORA A CONVERSA É ENTRE VOCÊS No debate público, afirmar “não ser agressor” é politicamente insuficiente. O ponto central é: o que cada homem faz quando outro homem é agressor? O pacto masculino de silêncio, analisado por estudiosas de gênero, é um dos pilares que sustentam a impunidade e dificultam o enfrentamento coletivo da violência (CONNELL; MESSERSCHMIDT, 2005). Romper esse pacto implica assumir responsabilidade social: intervir, denunciar, apoiar e transformar comportamentos. Trata-se de deslocar o eixo da responsabilização, deixando de exigir que as mulheres “se protejam” e colocando o ônus sobre quem produz e sustenta a violência. PROTEGER MULHERES É COMPROMISSO POLÍTICO A construção de ambientes seguros não é uma ação individual, mas uma estratégia política de defesa da vida. Mobilizar é cuidar, e cuidar é salvar vidas. Em um país onde o Estado frequentemente se omite, seja pela insuficiência de políticas de prevenção, seja pela fragilidade das redes de proteção, o machismo se expande como força estruturante de violência (PASINATO, 2015). Por isso, é urgente compreender que o enfrentamento ao feminicídio não é apenas tema de segurança pública, mas de cidadania e de projeto nacional. Negar que se trata de uma violência de gênero é negar sua raiz estrutural. E, ainda assim, ouvimos repetidamente que “não é sobre gênero”… até que outra mulher morre. CONCLUSÃO: DEMOCRACIA EXIGE MULHERES VIVAS A morte de mulheres não é um fenômeno isolado, mas expressão de desigualdades históricas. Proteger mulheres significa defender a democracia, fortalecer políticas públicas e enfrentar as bases sociais do machismo. Significa escolher a vida como sociedade, como Estado e como homens. Parem de matar mulheres. Não vamos silenciar. Queremos mulheres vivas. REFERÊNCIAS BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. CONNELL, Raewyn; MESSERSCHMIDT, James. Hegemonic Masculinity: Rethinking the Concept. Gender & Society, v. 19, n. 6, p. 829–859, 2005. PASINATO, Wânia. Feminicídio: Dinâmicas, Contextos e Desafios. Revista Estudos Feministas, v. 23, n. 2, p. 517–528, 2015. SAFFIOTI, Heleieth I. B. Gênero, patriarcado, violência. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2004. SEGATO, Rita Laura. Crítica da colonialidade: Rumo a um feminismo descolonial. Buenos Aires: Prometeo, 2012. SEGATO, Rita Laura. Pedagogias da crueldade. São Paulo: Elefante, 2018.
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7/10/20251 min read
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